Subiu as escadas e ingressou pelo escancarado pórtico.
Na obscuridade pairava teimosa neblina. Ruas aguçadas, emaranhado de nós.
Portas, janelas, ora diferentes, ora iguais. Nas paredes, fusão de impressões digitais.
Anastácia atónita, na braveza de enormes fontes, avança no labirinto.
Atmosfera de desgraça.
Ao espiolhar uma janela, sobressalta-lhe a impureza, engasga-se.
Avança. Afrouxa ante escombros desfeitos de corpos feitos.
Janela sequente. Depara-se com a brutalidade – martelo ensanguentado na criatura esvaída.
Horrorizada, apressa-se ofegante. Desenfreadamente, abre outra porta: a garotinha alicia o desposado cliente.
Mais à frente, a janela negra: oceano de mortandade.
No percurso presencia o abuso que à meninez rouba a inocência. Fica enojada!
À direita intrincada, criaturas manobradas em solidão… assiste à injeção.
Em cima, rostos estadistas, insaciáveis.
Ao fundo, no chão, um moribundo.
Janela enorme… o dinheiro imundo turva-lhe a visão. Esgotada, tomba.
O teto desaba em labaredas de ódio. Ferida, em agonia profunda, Anastácia tenta desesperadamente encontrar a saída. Faltam-lhe as forças, desfalece…
Por instantes, abandona-se…
(O grito descrente abre-lhe a passagem)
Pestaneja. Depressa percebe a luz infinita.
Trémula, ergue-se. Repara nas paredes cristalinas, sublimidade em redor.
Caminha. Pasmada e sem entender nada, espreita a janela da calma que lhe serena a alma.
Segue em frente. Janela ante porta, namorados à espreita, num mar de rosas de cetim. Cisnes bailantes, som de harpa. Todas as janelas emanam perfume de frutos exóticos. Em cada porta, o convívio fraterno, sob nuvem de honestidade. Nas ruas da liberdade, o algodão embebe-se nas flores. O céu é de veludo.
Anastácia empolgada é impulsionada pela chama do amor.
No final, junto às escadas, um poema dourado mesclado de perdão, sem preconceito, num círculo de pombas brancas.
Desceu cada degrau… girava-lhe o mundo silêncio.
Finalmente encontrou a chave da saída!
– Abriste os olhos!!! Anastácia, meu amor, estás viva!
Foto: Mari Korz