No meu tempo havia cassetes e quando a fita se embrulhava como novelo era uma chatice! No meu tempo havia discos que os adolescentes de hoje querem recuperar dos avós. No meu tempo havia tempo para estar com a vizinha a conversar à porta, não havia vergonha de pedir um ramo de salsa. Os homens não rapavam o peito. Não se usava ténis com saia. Jogava-se ao berlinde, à macaca, ao elástico, ao ringue e podíamos brincar até à noite.
Hoje, levamos filhos à escola para os proteger do trânsito (não existe a cultura da bicicleta) ou porque teríamos de os acordar mais cedo. No meu tempo, ia a pé para a escola porque ficava perto. Depois, de autocarro e nas tardes livres fazia 8 km a pé.
A música está hoje mais acessível, plataformas que disseminam autores e, sem custos, ouvimos sons aleatórios. Já lá vai o tempo dos CDs. Porém, não se valoriza devidamente o esforço e empenho dos músicos portugueses, parece que só o que importado é que bom. E isto é em tantas áreas… como na literatura. Obviamente que há os bons exemplos e se dá o real valor ao que é feito pelos tugas.
Já não alugamos filmes no videoclube como mandava a tradição, agora estamos sentados no sofá pontuando a vida sedentária.
Ontem, milagrosamente a descer as escadas de um prédio, um senhor que por mim passou, disse «boa tarde» e parva fui eu por me ter habituado que é feio falar com desconhecidos.
O quanto eu quis ter uma boneca! A que tive não lhe podia mexer para não a estragar. As campanhas consumistas esfregam as mãos ao aproximar-se o dia da criança. Agora ando com a mania de ir comprar uma.
As crianças já não brincam nem se olham nos olhos. Nos corredores da escola, temos de ter cuidado para não tropeçar nas longas pernas. Os alunos sentados lado a lado a dedilhar. Não se diz palavrinha. Não se socializa para saber resolver conflitos quando eles chegam. Andamos a criar filhos que não carecem de esforçar porque o telemóvel os satisfaz como droga. Nos intervalos, jogos ensinam violência entretêm os adolescentes. E volto a lembrar que no meu tempo jogar ao ringue era mais do que uma aula de educação física! Era ali que aprendíamos a gerir emoções e não tínhamos excesso de peso. Hoje, pagamos ao nutricionista e ao psicólogo.
Como gente evoluída temos o Dr Google para responder aos como, aos porquê. A última moda é gritante. Os professores andam à cata como aos piolhos para ver quem fez trabalhos usando o Chatgpt. E mais uma vez sem qualquer esforço vemos que nos dá jeito alguém pensar, pesquisar, conceber e procurar por nós. É ter a papa feita sem necessidade de perder tempo.
Seres pensantes como nós já não precisamos de ler. No outro dia, disse-me a vendedora da livraria «Não se vende nada!». A biblioteca parece assombrada pelo silêncio, onde um senhor lê o jornal. Para ler, precisamos de parar, devorar palavras, concentração, momentos a sós com nós mesmos. E como gente evoluída deixamo-nos levar para que pensem por nós e qualquer dia seremos vegetativos andantes a comer de tudo o que nos querem dar. Salvam-se os jornalistas que têm acontecimentos para variados gostos. Desde mentiras de um governo, ‘chupança’ de língua de um líder religioso, o anúncio de greves dos professores, viagem a Júpiter, assédio, a crise no imobiliário, guerra, mortes, assaltos.
Temos de tudo, menos vontade de trabalhar; no meu tempo tínhamos de trabalhar para conseguir. Pergunte-se a cada patrão em Portugal. Vão dizer-nos da aflição em que vivem. Salvam-nos os imigrantes que nos servem, que plantam as cebolas e apanham os morangos que comemos.
Ah, é verdade, também escrevo no computador, mas tenho o caderno para delinear as letras da minha vida. Na tela ou no papel quero ler muito. Sem tempo para ler, porque a vida é à pressa, o melhor é apontar na agenda.
10 opiniões sobre “Evoluímos para melhor?”
Como amo a tua escrita Andréia!! Serei sempre uma das tuas seguidoras !! Quanta verdade nesta (apenas uma de muitas) partilha!
Eu pessoalmente identifico-me muito com este texto!!
Obrigada pela tua excelência!
O Senhor continue a abençoar-te ! Tanto quanto tu nos abençoas através da tua escrita ✍️ Obrigada 🙏🏻
Muito obrigada Elsinha! Beijinhos grandes…
Amanhã podes ler novo texto…
Lindo texto Andrea,ao ler este texto fez-me dar uma voltinha ao passado sem sair do presente, é sentir as diferenças de um tempo que já passou mas que afinal nem foi assim há tanto tempo. Um bjinho e que Deus te abençoe muito 😘
Oh, quantas saudades tuas. Muito obrigada! Continua a ler no meu blog e é dessa forma que também me incentivas a evoluir… Beijinhos
Grande verdade Andreia gosto muito de ler a tua escrita ! Parabéns! Beijinho grande para ti e restante família ! Adoro vos 😘😘❤️❤️🙏🏻🙏🏻
Muito obrigada, Júlia!
Bem haja! Beijinhos.
Tal com à Andrea, este é um assunto que também me preocupa muito. Assusta-me assistir ao rápido avanço da sociedade no sentido do egocentrismo, da falta de sensibilidade e empatia, da falsidade e de outros “males sociais” que estão a contribuir para a sua degradação.
Obrigada pelo seu comentário, Cristina.
Vamos tentando fazer a nossa parte, emanar valores de vida…
Que lindo texto ❤️
Muito obrigada, querida Brenda.
Continua a ler no meu blog as novidades…
beijinhos