Vou no autocarro. As máscaras, felizmente já não tapam rostos. Também já não escondem sorrisos, não servem mais para amparar lágrimas, esconder o nariz vermelho de tantas assoadelas ou ocultar herpes.
Sinto-me estranha, esquisita. Talvez porque bastaram dois anos para não sair de casa sem levar na mala meia dúzia de máscaras e ter na dispensa frascos de desinfetante.
Parece-nos que o tempo do vírus passou.
Ou ele se escondeu por um tempo?
Deveríamos estar as pulos de alegria?
Já nos podemos renuir e nem vivi no tempo da PIDE!
O sentimento é de que estou a infringir algo ou que me falta alguma coisa.
Porém, há vírus escondidos nalguns lugares. A semana passada, no regresso das férias, estou no aeroporto de Cancun com a família e eis que na zona de controlo nos é exigida a colocação de máscara. Só nesse local. Quando mostro o passaporte tenho de baixar a máscara. Não sou contra as máscaras. Tenho é a sensação de que o vírus escolhe locais específicos para reinar.
Dois anos foram pesados.
Todos sabemos o que fizemos no confinamento.
Exceto aqueles que se foram, digo-o com tristeza. Serão esses os nossos heróis? Entregaram a vida a um vírus que por aí passou.
Pergunto-me porque não fui eu. Não que eu ambicione morrer. Pois ele, por cá também deixou os seus efeitos. E agora, estaremos a lembrar essas pessoas?
Na comunicação social todos os dias se falava das consequências desse malvado. Falava-se do número de pessoas mortas. E agora, falamos do número de pessoas vivas? Regozijamos porque alguns de nós e vários familiares não se foram? Falamos de histórias de sobrevivência?
Vivemos num tempo novo? Dias de gozo porque podemos enfim, respirar, ir ao concelho vizinho sem ter que mostrar documentos às entidades. Já não limpamos os sapatos cada vez que chegamos a casa, nem lavamos os sacos do supermercado, nem trocamos de roupa a toda a hora. Que tempo é este onde temos de perguntar se podemos dar um beijo? Mal se ouve tossir, afastamo-nos.
Ontem, numa reunião de escola foi dito que se os alunos tiverem tosse, o melhor é ficar em casa. Se o teste de covid der negativo, deveriam os alunos usar máscara. Que bicho papão nos leva a agir como se estivéssemos agora a aprender a lidar com vírus. Já não podemos ter tosse?
O que vai ser de nós, pessoas, se vivermos sempre com medo?
Medo de transportar um vírus nas nossas mãos.
Medo de estar numa sala com muitas pessoas.
Estará alojado na nossa mente?
Deixámos de ser razoáveis?
Teremos de aprender novamente a viver em sociedade?
De quantos anos precisaremos?